Saudações a todos!
Após um tempinho sem postar aqui, novamente cá estou
compartilhando minha alegria em poder dizer que continuo no mesmo propósito de não
usar drogas, só por hoje, um dia de cada vez.
Novamente não tenho palavras para expressar tamanha felicidade
em poder desfrutar de um novo amanhecer, principalmente pelo mesmo ser livre
daquelas tremendas ressacas e doses de ressentimentos da noitada anterior.
Agradeço ao Poder Superior por mais um dia de vida, por
esse dia ser tão especial, ao ponto de estar aqui com vocês, neste cantinho
onde posso compartilhar minhas experiências, forças e esperanças, onde irei ser
compreendido e onde me identifico com cada um de vocês.
Hoje quero falar aqui um pouquinho sobre minha condição de
aceitar o meu familiar usando drogas.
Talvez poucos aqui saibam, mas tenho familiares que fazem
uso e abuso de drogas. Tenho irmãos que, literalmente, moram nas ruas. Vivem
nas ruas de Recife-PE. Também tenho outros familiares que estão na ativa e
vivem pelo mundão, completamente “rodados”.
Quando eu estava na ativa, eu vivia do mesmo jeito ou até
pior que eles estão vivendo hoje. Minha adicção às drogas me levou ao extremo
limite do possível e até mesmo do impossível, no que diz respeito às condições (des)humanas,
em todos os seus conceitos moral, ético, social, espiritual, etc.
Tornei-me um
ser extremamente diferente do que a sociedade normalmente costuma ver em
episódios envolvendo dependentes químicos. Talvez seja por isso que
especialistas insistem em afirmar que, independente de se tratar de usuários de
drogas ou não, existem pessoas extremamente desequilibradas e que seus
comportamentos não tem nada relacionado com o uso de drogas. Personalidades (organização
dinâmica dos aspectos cognitivos, afetivos, fisiológicos e morfológicos do
indivíduo) cada um tem a sua.
Com isso, e com
todo um histórico de insanidades que tenho, aprendi a me relacionar com meus
iguais de uma maneira igualitária. Confesso que, logo quando entrei no processo
de recuperação, foi difícil isso para mim. Mas com o passar do tempo, fui
entendendo a necessidade de entregar tudo nas mãos do Poder Superior.
Logicamente que primeiro tive que vir a acreditar nesse Poder Superior, pois eu
era um ateu e atoa. Rejeitava qualquer idéia de que existia Deus ou Poder
Superior. Somente após reconhecer que, por motivos maiores que os meus e
vontades alheias às minhas, eu estava sem usar drogas, foi que comecei a ver
que algo estranho estava acontecendo em minha vida e que isso realmente era um “milagre”.
Então comecei a acreditar que “milagres” existem, pois eu sou um. Conseqüentemente, comecei a acreditar num
Poder Superior.
Não é fácil aceitar que um familiar nosso esteja se
desgraçando nas drogas e que nós não possamos fazer absolutamente nada, sem que
esse familiar se prontifique a também fazer algo.
Não é fácil ver um familiar nosso acabando com sua vida e
consequentemente com a nossa e termos que ficar com aquela sensação de
impotência, como se estivéssemos de mãos atadas.
Não é fácil passar pelas ruas e ver seu irmão (filho,
marido, namorado, esposa, sobrinha, etc) largado nas calçadas ou praças, como
se não tivesse família. Não é fácil ver
seu familiar em baixo de um viaduto, deitado ao sereno das madrugadas, coberto
com um papelão molhado de álcool de posto, derramado após uma disputa de dois
embriagados por uma dose.
Não é fácil ter que assistir seu familiar mendigando nas
ruas do bairro onde nasceu e se criou; numa localidade onde todos sabiam do
carinho e dedicação dos pais ou demais familiares, para cuidar, educar, acolher
e o tornar cidadão de bem, mas que chega uma porra de uma tal de “droga” e o
rouba de seu leito familiar, tirando toda aquela formação e educação até então
recebida.
Não é fácil comprarmos coisas para nossa casa e depois
darmos conta que, literalmente, virou fumaça.
Não é fácil ir visitar nosso familiar uma cadeia. Não é
nada fácil enterrarmos nosso familiar o qual perdemos para as drogas.
Não é nada fácil aceitar que estamos perdendo uma parte de
nossa família de uma maneira tão trágica, como é ter um familiar dependente
químico. Não é nada fácil aceitar nossa impotência perante nosso adicto e
entender que, por mais que nos dispusemos a ajudá-lo, ainda assim, nossa ajuda
se torna mínima, quando não há uma aceitação por parte de nosso adicto. O que
podemos e até devemos fazer, é cuidar de nos tratarmos, pois estamos tão
doentes quanto ele, sob uma codependência.
Eu comecei a ter uma melhor qualidade de vida no que diz
respeito aos meus familiares, quando comecei a respeitar as escolhas. Comecei a
entender que eu também havia feito aquela escolha e não importava a ninguém o
que eu queria para minha vida. Nunca me preocupei com o que os outros iriam
pensar ou falar de mim. Nunca me preocupei com as conseqüências de minhas
insanidades. Não existia respeito aos meus pais nem muito menos as Leis. Minha
arma carregada era o meu deus e foda-se todo mundo! Tirar sangue alheio era tão emocionante
quanto era aplicar cocaína em minha corrente sanguínea. (Se você, leitor(a)
nunca atirou em alguém ou nunca injetou cocaína nas veias, jamais poderá
entender quanta ênfase eu dei ao termo “emocionante”). Trocar tiros era tão
adrenalizante quanto participar de uma troca de corda num batizado de capoeira.
O estampido de um tiro era tão excitante quanto sentir uma mulher gemendo ao
meu ouvido. Massacrar era minha arte preferida. Drogar-me era imprescindível
para minha sobrevivência. Nunca me importei sob quais condições estava vivendo:
se sob o conforto de uma vida regada pelo tráfico de drogas ou sob o total
desconforto de um confinamento de um regime de reclusão. Nunca me importei se
estava sentado numa cadeira de praia ou no banco do réu. Tanto fazia se eu
estava nos meus “melhores” dias, quando de minha atividade “profissional” no
crime organizado, ou se na sarjeta, nas ruas, pela conseqüência de minha dependência
às drogas. O que importava era que eu queria ser o mais doido, o mais maluco e
o mais drogado.
E por ser portador de uma doença também comportamental,
tenho que ser vigilante a essas questões que ainda hoje me cercam, pois eu
conjuguei o verbo no passado, mas confesso que se tivesse conjugado no
presente, não estaria mentindo. Confesso que em muitas destas situações acima,
infelizmente ainda as tenho com a mesma visão, ou seja, ainda as acho
emocionante, adrenalizante, excitante, do mesmo jeito. Ainda bem que não acho
imprescindível me drogar. Mas tenho que me atentar para não continuar dizendo: "Meu estilo é pesado e faz tremer o chão, minha palavra vale um tiro eu tenho muita munição. Na queda ou na ascensão minha atitude vai além, e tenho disposição pro mal e pro bem..." (Racionais MC's)
É assim que muitos hoje estão vivendo e eu tenho que
respeitar suas escolhas. É assim que meus irmãos estão vivendo e eu tenho que
respeitar as escolhas deles.
Eu até posso fazer algo por eles, como de fato tenho feito:
estou sempre me colocando à disposição para ajudá-los, mas da forma mais
coerente, pois da forma mais emotiva, quem se prejudica sou eu.
Afinal, diante do meu histórico, “mas quem sou eu pra
falar de quem cheira ou quem fuma?”
Entendo que o momento de cada um chegará. Se não chegar o
momento de parar em vida, chegará o momento de parar com a morte. Disso eu não
tenho dúvidas. Somente espero que todos tenham a mesma Dádiva que eu estou
tendo. Viver como eu vivi e conseguir sair é realmente um verdadeiro milagre.
Sou apaixonado por leitura e músicas. Algumas delas me
fazem voltar ao tempo. Outras me fazem refletir. Já outras...
Quero aqui fechar com um trecho de uma música de RACIONAIS MC’s.
Essa música serve tanto para quem está na ativa e de repente passou aqui em meu
blog, quanto para quem está com um familiar fazendo uso/abuso de drogas.
Lembremos de que “eles são nossos irmãos também”.
“Ei Brown, sai fora! nem vai, nem
cola.
naum vale ah pena da ideia nesse tipo ai
ontem ah noite eu vi na beira do asfalto
tragando ah morte, soprando ah vida pro alto
oh os cara! soh o pó,pele e osso
no fundo do poço, mó flagrante no bolso
veja bem, ninguém eh mais que ninguém
veja bem, veja bem e eles são nossos irmãos também.
pá de cocaina e crack, whisky e conhaque
os mano morre rapidinho sem lugar de destaque
mas quem sou eu pra falar de quem cheira ou quem fuma? nem dá
nunca te dei porra nenhuma...
voce fuma o que vem, entope o nariz
bebe tudo que vê, faça o diabo feliz"
naum vale ah pena da ideia nesse tipo ai
ontem ah noite eu vi na beira do asfalto
tragando ah morte, soprando ah vida pro alto
oh os cara! soh o pó,pele e osso
no fundo do poço, mó flagrante no bolso
veja bem, ninguém eh mais que ninguém
veja bem, veja bem e eles são nossos irmãos também.
pá de cocaina e crack, whisky e conhaque
os mano morre rapidinho sem lugar de destaque
mas quem sou eu pra falar de quem cheira ou quem fuma? nem dá
nunca te dei porra nenhuma...
voce fuma o que vem, entope o nariz
bebe tudo que vê, faça o diabo feliz"
Um forte e carinhoso abraço a todos e que o Poder Superior,
em Sua infinita bondade, nos conceda o direito de reconhecer, aceitar e
realizar a Sua Vontade em todas as nossas épocas e lugares, para que só assim,
possamos ser merecedores de Suas Dádivas, como saúde, paz, serenidade e
sobriedade.
Eu continuo sendo o Júnior, um adicto em recuperação,
Limpo, Só Por Hoje.
TAMUJUNTU.
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